Ouvi pela primeira vez falar da artemísia, quando estava na tropa, ao mestre Kobayashi, professor japonês que então ministrava aulas de judo na Polícia Militar onde este escriba, na altura oficial miliciano, desempenhava o cargo de tesoureiro. O venerando mestre era um poço de sabedoria e embora fosse de poucas falas, eu, beneficiando da privilegiada situação de ser o pagador dos ordenados, lá lhe conseguia arrancar alguns ensinamentos. Lembro-me que, para prestar serviço pontual na PM, teve de assinar um documento em papel selado com assinatura reconhecida, declarando que não era comunista nem nunca tinha professado ideais comunistas ou para-comunistas. Compreende-se, nesses tempos “em que os comunistas faziam mal às pessoas de bem”, todo o cuidado era pouco. Mas não fujamos com o rabo à seringa, que isso para agora não interessa nada. Quando alguém tinha um entorse ou uma dor, o mestre utilizava, com efeitos notáveis, a técnica da “moxa” que consistia numa espécie de cigarro feito de folhas secas de artemísia que ele acendia e colocava nos pontos vitais do corpo do paciente.

Familiarizei-me depois com tal erva que ostenta o nome de deusa grega. Ela encontra-se dispersa como planta silvestre por todo o mundo temperado e tropical.
Tenho-a encontrado em profusão em várias regiões, desde a Coreia do Norte ao México ou a Cuba, onde existe mesmo uma encantadora cidade chamada Artemísia.

A Artemisia vulgaris L é uma herbácea perene de pequeno porte. Se os ramos não estiverem prostrados como a que tenho no meu quintal, ela atingirá um metro
de altura. O seu caule é levemente purpurado e as folhas são verdes na parte superior e esbranquiçadas ou cinzentas na inferior, devido à camada de pelos de
que são providas. Aliás, toda a planta é tomentosa e exala um odor inconfundível.
Os capítulos florais dispõem-se em panículas com pequenas flores tubulares, geralmente amareladas. A toiça radicular é lenhosa.

Cabe aqui lembrar que há muitas espécies de artemísias (como as há de deusas), todas da evoluída família das asteráceas ou compostas. No sapal das Hortas (Alcochete) aparece com frequência uma int eressante halófita que se pode designar como artemísia marítima. A que ora abordamos, a chamada artemísia vulgar,
tem sido objeto de muitas investigações no tocante aos seus componentes. Comprovadamente, possui óleos essenciais (cineol, linalol e outros), resina, tanino,
inulina, princípios amargos, provitamina A e vitaminas B1, B2 e C.

Tem imensas propriedades medicinais: emenagoga, antiespasmódica, diurética, febrífuga, tónica, vermífuga, antiinflamatória e antidepressiva. Possui um efeito estimulante sobre a secreção da bílis dando bons resultados no tratamento das perturbações digestivas, vómitos,  diarreia, nevralgias e fraqueza geral.
Utilizada desde os tempos da antiga Grécia para combater a fadiga e aliviar as epilepsias através da mastigação das folhas, tornou-se, mais tarde, popular no tratamento dos distúrbios menstruais, regularizando os ciclos e aliviando as concomitantes e as dores após o parto. O “chá” das folhas tomado meia hora antes
das refeições prepara o organismo para a digestão, tendo um efeito desintoxicante em todo o aparelho digestivo.

O Dr. José Lyon de Castro recomenda o infuso de 10 g de folhas secas para 1 litro de água, bebendo-se duas ou três chávenas por dia, com uma ressalva: as grávidas não as devem tomar.

O curioso Manual de Medicina Doméstica do Dr. Samuel Maia refere, entre outras coisas, que, com as folhas pisadas da artemísia, se faz um emplastro que aplicado ao ventre das crianças, funciona como vermífugo.
Deve-se acrescentar que para usos externos a planta parece não ter contraindicações. Já o mesmo não acontece no caso do “chá”. Depois de se tomar dez
dias seguidos, convém parar outros dez dias porque a artemísia vulgar (aliás, todas as artemísias) contém determinados elementos que podem ser tóxicos para
certos organismos.
Os orientais costumam temperar os pratos com as folhas e os botões florais para enriquecer o sabor dos alimentos. É pois uma apreciada especiaria, sobretudo
para comidas confecionadas com muita gordura.
Finalmente, a artemísia é também usada como planta espiritual no continente americano, desde o tempo dos Aztecas e é, por alguns, fumada como substituto
do tabaco e da marijuana, sem os seus efeitos nocivos, obviamente.

Nota: Estudos recentes referem que a artemísia é utilizada no combate à malária.

 

Dr. Miguel Boieiro

Instituto Holiterapias

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